A propósito da recente proposta de Manuel Pizarro para a criação de uma loja do cidadão na praça de Lisboa, vieram-me à memória sensações longínquas.

Um dos desígnios da arte sempre foi esse, posicionar o fruidor perante o inesperado, porque novo, ou pelo menos resultante de uma visão nova e singular do criador.
Não creio que o projecto da praça de Lisboa, e a sua realização tal como hoje a conhecemos tivesse amplas ambições quanto a constituir-se como objecto de excelência no panorama artístico. Antes pelo contrário, tudo me leva a interpretar o processo como um mecanismo de defesa face à magnificência da envolvente. Quem, em boa verdade, e de forma consciente, se proporia intervir de outra forma mesmo junto à torre dos clérigos, um dos maiores expoentes arquitectónicos do país? Quem, entre os Clérigos e a Universidade, há vista da cadeia da Relação (já para não falar dos leões) se proporia criar um objecto extrovertido?

Pode o mundo parar no meio do turbilhão? Pode o tempo parar e relegar-nos para um estado de mera contemplação? Pode, mas não por muito tempo. À semelhança do que dizem ser a atmosfera surreal do interior de um ciclone, onde o vento para e o ruído desaparece, também o bunker no meio da praça está condenado a só servir esse momento em que abrimos um pouco os horizontes dos nossos sentidos. Sob pena de, tal como acontece com o ciclone, destruir tudo em redor.

Perpetuar o lugar onde nada se passa mas muito se avista pode parecer, e ser, muito interessante, não fora a circunstância de ser exactamente disso que se vem afastando as pessoas, assim que encontram possibilidades de sustento fora da estrita exploração directa e disseminada no território. Foi por isso que criaram as cidades.
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