sexta-feira, 12 de março de 2010

A cidade estática

A propósito da recente proposta de Manuel Pizarro para a criação de uma loja do cidadão na praça de Lisboa, vieram-me à memória sensações longínquas.
A ideia de percepcionar a cidade estática enquanto experiencia da vivencia do fenómeno artístico de grande escala; à semelhança de algumas instalações urbanas cujo fim em si mesmo mais não é do que essa vivencia temporária.
Um dos desígnios da arte sempre foi esse, posicionar o fruidor perante o inesperado, porque novo, ou pelo menos resultante de uma visão nova e singular do criador.
Não creio que o projecto da praça de Lisboa, e a sua realização tal como hoje a conhecemos tivesse amplas ambições quanto a constituir-se como objecto de excelência no panorama artístico. Antes pelo contrário, tudo me leva a interpretar o processo como um mecanismo de defesa face à magnificência da envolvente. Quem, em boa verdade, e de forma consciente, se proporia intervir de outra forma mesmo junto à torre dos clérigos, um dos maiores expoentes arquitectónicos do país? Quem, entre os Clérigos e a Universidade, há vista da cadeia da Relação (já para não falar dos leões) se proporia criar um objecto extrovertido?
Porém, retirar à “vista” da cidade os seus principais elementos dinâmicos, mantendo como focos de atenção a estaticidade das fachadas, atirou com o projecto da praça de Lisboa para a galeria das instalações artísticas, efémeras, e por isso mesmo condenadas a desaparecer.
Pode o mundo parar no meio do turbilhão? Pode o tempo parar e relegar-nos para um estado de mera contemplação? Pode, mas não por muito tempo. À semelhança do que dizem ser a atmosfera surreal do interior de um ciclone, onde o vento para e o ruído desaparece, também o bunker no meio da praça está condenado a só servir esse momento em que abrimos um pouco os horizontes dos nossos sentidos. Sob pena de, tal como acontece com o ciclone, destruir tudo em redor.
Claro que o tempo curto dos fenómenos meteorológicos precipita impactos não facilmente perceptíveis no tempo mais longo das cidades, independentemente de outros paralelismos que se possam encontrar. Também os ciclones modelam cenários à sua passagem, e nem todos são de mera destruição. Tal como na praça em redor do bunker, os momentos não são todos iguais.
Perpetuar o lugar onde nada se passa mas muito se avista pode parecer, e ser, muito interessante, não fora a circunstância de ser exactamente disso que se vem afastando as pessoas, assim que encontram possibilidades de sustento fora da estrita exploração directa e disseminada no território. Foi por isso que criaram as cidades.

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